1ª Parte do Grande Expediente
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26/03/2015
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16ª Sessão
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Senhor Presidente, caros vereadores, senhoras e senhores: nós
estamos vivendo um dualismo, o que significa que temos uma realidade
constitucional e uma realidade do dia a dia.
A realidade constitucional determina
que a criança seja alvo da proteção integral – isso diz a Constituição
brasileira. A realidade do dia a dia, através da mídia e de nossos
comportamentos em geral, ainda está defendendo a doutrina da situação
irregular. Mas, o que é isso? A doutrina da situação irregular e a doutrina da
proteção integral?
O que está no dia a dia é a doutrina da
situação irregular, que tem como base o Código de Mello Mattos, de 1927. Vejam
bem, Código de Mello Mattos, de 1927. O que dizia esse código? Qual era o
pensamento? Qual era o norte desse código? Ele instituía a figura do Juiz de
Menores. A função dele era tomar decisões quanto ao destino dos adolescentes,
autores de atos infracionais. Veja bem a cabeça. O pensamento dominante não era
de proteção da criança e do adolescente, mas de recolhimento com a finalidade
de proteger a sociedade.
Então, essa era a visão do Código de
1927 que até hoje está vigindo na cabeça das pessoas, em contraposição ao que
diz nossa Constituição.
O que é a proteção integral? Ela surge
em 1946, com o fim da guerra, portanto, um ano depois, em virtude de milhares
de crianças, milhões de crianças ficarem órfãs e, portanto, portadoras de
necessidade, na época, e que precisaram de uma proteção dos Estados. A criança,
então, a partir dessa doutrina, passa a ser reconhecida como sujeito de
direito. Isso em 1946. No Brasil, somente em 1988, com a Constituição, em seu
Art. 227, é que essa doutrina da proteção integral passa a fazer parte do documento
magno de nossa Pátria.
Mas vejamos bem a contradição: embora
em 1988, isso já faça parte da Constituição, no dia a dia, estamos vivendo
ainda a doutrina de 1927, em que as pessoas somente pensam em proteger a
sociedade e não a criança. Esse é o pensamento reinante.
O Art. 227 da Constituição, portanto, o
artigo que defende a proteção integral da criança e do adolescente, diz o
seguinte, para nós raciocinarmos: é dever da família, em primeiro lugar, da
sociedade e do Estado assegurar direitos à criança e ao adolescente com
absoluta prioridade. Vejam bem, os agentes são a família, a sociedade e o
Estado. E a prioridade absoluta para quê? Primeiro, o direito à vida, à saúde,
à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura e à dignidade.
Esses são os direitos. Segundo, ao respeito. A criança tem direito ao respeito.
Terceiro, a criança tem direito à liberdade. Isso é prioridade. A convivência
familiar ia colocá-las a salvo de toda forma de negligência, discriminação,
exploração, violência, crueldade ou opressão.
Vejam bem que o artigo é muito sábio,
muito rico, e permite que a gente faça algumas reflexões. Quais são as
reflexões que podemos fazer então desse artigo? Primeiramente, ele sinaliza que
os direitos da criança e dos adolescentes são de responsabilidade das gerações
adultas. Somos nós. E quantas vezes ouvimos falar assim: “A essas crianças
falamos somente de direitos? E os deveres?” Os deveres são dos adultos. Os
deveres constitucionalmente são dos adultos. Não há que se cobrarem deveres de
crianças, a não ser os deveres comezinhos, aqueles normais, fazer a criança
estudar. Mas isso é questão da família cobrar. Segundo, a família, a sociedade,
o Estado são as três instâncias reais e formais de garantia desses direitos.
Portanto, não é a criança; somos nós. A família é a esfera inicial natural e
básica dessa tensão. Com esse modelo neoliberal que nós temos, a desintegração
da família está ai. Portanto, quem deveria ser o primeiro núcleo, o primeiro
agente a garantir esses direitos está completamente desintegrado.
Ao Estado cabe garantir as condições
mínimas para que a família exerça o seu papel. Portanto o segundo agente, que é
o Estado, não tem políticas públicas para que essa família já desintegrada, já
com dificuldades, supra, de forma alguma, essas carências que a família tem em
exercer as suas obrigações.
A expressão prioridade absoluta indica
que, em qualquer circunstância, o interesse da criança deverá prevalecer. Ainda
em relação ao Art. nº 227, o emprego da palavra direito - e não necessidades -
significa que a criança e o adolescente deixam de ser encarados como portadores
de necessidades e passam a ser vistos como detentoras de todos os direitos
fundamentais que um adulto tem, claro, adaptados à sua idade. Não há que se falar,
portanto, em obrigações de crianças, são direitos, ou então que se rasgue a
Constituição.
Para disciplinar a Constituição
Brasileira, esse Art. nº 227 vem em 1990, portanto há 25 anos, o Estatuto da
Criança e do Adolescente que regulamenta as conquistas em favor das crianças e
dos adolescentes expressos nessa Constituição de que falamos, que é a vigente,
e esse estatuto é reconhecido como modelo de legislação para infância em todo
mundo. Mas a gente houve muita gente criticando: Ah, depois que o ECA apareceu
a marginalidade subiu. Quer dizer, a culpa é da legislação, as pessoas não
querem assumir que a sociedade, a família e o Estado não cumprem o seu papel.
Nele, nesse estatuto, a criança e o adolescente constituem sujeitos de direito
ratificando o que diz a Constituição e não mais meros objetos de intervenção
social e jurídica e por isso a família, a sociedade e o Estado têm que assumir
o seu papel.
Para finalizar, Senhor Presidente, as
conclusões. Mas não basta que os direitos estejam no papel. É preciso um
sistema que garanta esses direitos. A promoção dos direitos se faz com efetiva
implementação das políticas de atendimento que devem ocorrer de forma
articulada, e não segmentada, como já falamos aqui em outros momentos. Para um
futuro melhor para as nossas crianças, não faltam leis e, sim, políticas
consistentes, por isso é importante saber de quem cobrar e o que cobrar. Para
isso, Senhor Presidente, o Poder Público e, no caso, defendemos insistentemente
que a Prefeitura mande um projeto de lei para esta Casa, para estabelecermos
aqui a criação da Secretaria da Criança e do Adolescente, para que essas
políticas públicas possam efetivamente ser implementadas e para que nós
possamos cobrar.
Muito obrigado.