1ª Parte do Grande Expediente
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21/05/2015
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Discurso
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Senhor Presidente,
Senhores vereadores, senhoras e senhores, hoje eu selecionei, para comentar
aqui, um tema da nossa Comissão Permanente da Criança e do Adolescente. O
título é: “A criança como prioridade absoluta e o descaso do poder público e da
sociedade”. Eu indago: por que defendemos a doutrina da proteção integral para
a criança e para o adolescente, que está definida em nossa Constituição? Porque
estamos certos de que, enquanto assim não procedermos, estaremos permitindo que
as crianças se tornem pessoas frustradas, marginalizadas, sem perspectivas e
que sejam cooptadas pelas oportunidades negativas, como ocorre com o tráfico de
drogas nas grandes cidades. Não adianta apenas a oferta de vagas nas escolas: é
preciso que se implemente uma política de atendimento amplo à criança, como
determina o Artigo 227 da nossa Constituição, a Lei 8.069/90 e a Convenção
Internacional dos Direitos da Criança.
As nossas crianças estão abandonadas,
isso é uma constatação. O Poder Público e a sociedade não cumprem seu papel,
isso é outra constatação. E estarei aqui agora elencando alguns casos para
ilustrar. Dia 19 de maio, jornal O Dia: “Mãe é presa por torturar bebê de seis
meses para irritar o ex-namorado”. A criança abandonada dentro de casa. Jornal
Extra do dia 1º de maio, este ano: “Menina de 3 anos é morta por suspeitos que
procuravam pelo irmão dela. Luane brincava na porta de casa quando dois homens
armados chegaram procurando pelo irmão. A criança foi morta dentro de casa”.
Dia 2 de abril, jornal Extra: “Homem espanca e mata a filha de 8 meses por se
irritar com o choro do bebê”. Criança abandonada dentro de casa. Dia 19 de
maio, jornal Extra: “Suspeito de matar filho de 1 ano, após término de namoro,
é preso”. Afirmativa dele, em depoimento: “Não gostava muito da criança”.
Criança morta e abandonada dentro de casa. Jornal Extra, 19 de maio: “Garoto de
12 anos é um dos mortos em ação da Polícia Civil na Zona Norte do
Rio”. Criança desprotegida na rua. “Menina de cinco anos
desaparece em Duque de Caxias”. Isso em 18 de maio, no jornal O Dia. E no
dia 19 de maio vem, infelizmente, a notícia complementa: “Menina de cinco anos
– portanto, a mesma criança que estava desaparecida – é encontrada morta perto
de casa”.
Estamos vendo que não são apenas essas
crianças abandonadas, que viram adolescentes abandonados, e que o Congresso
quer reduzir a maioridade penal.
Lendo nota de jornal de São Paulo, de
19 de maio: “‘Ela não está nada bem’, diz mãe de menina estuprada por três, em
São Paulo. Uma menina de apenas 12 anos foi arrastada para dentro de um
banheiro masculino da escola onde estuda e estuprada por três adolescentes, na
tarde da última terça-feira, 12 de maio.” Criança abandonada dentro da escola.
Portanto, existe criança abandonada
dentro de casa, dentro da escola, na rua, em seu próprio quintal. Então, a
legislação que trata da criança é ótima, mas o poder público e a sociedade não
cumprem esse papel.
Eu trouxe aqui um trecho para
refletirmos.
“A Lei nº 8.069 de 13 de julho de 1990,
o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), é o detalhamento do artigo 227 da
Constituição Federal e a tradução brasileira da Convenção Internacional dos
Direitos da Criança.”
Quer dizer, não satisfeitos, a
sociedade não somente não cumpre o Estatuto, como não cumpre a Constituição,
nem os tratados internacionais dos quais o Brasil é signatário.
O SR. CESAR MAIA – Um aparte, Senhor
Vereador.
O SR. PROF. CÉLIO LUPPARELLI — Pois
não, Vereador Cesar Maia.
O SR. CESAR MAIA – Hoje, no caminho
para buscar o Doutor Antonio Sá para vir para o trabalho, o motorista dele foi
assaltado, levou tiro, e agora está hospitalizado em estado grave. Só para
mostrar que essa violência está banalizada.
Obrigado.
O SR. PROF. CÉLIO LUPPARELLI – Pois
não.
Muito obrigado pela contribuição,
Senhor Vereador.
Senhoras e senhores, vejam o teor e o
valor que o ECA tem.
“Não existe na America Latina outro
processo tão participativo como da construção e implementação do Estatuto da
Criança e do Adolescente”, afirma o jurista argentino Emilio García Mendez. O
Estatuto não foi apenas uma mudança de conteúdo, mas uma mudança no processo de
construção de uma lei. No entanto, apesar do envolvimento da sociedade civil,
de acordo com ele, as instituições de educação, na época, não se envolveram
muito com o movimento porque teria percebido o Estatuto mais como um
conservador ou mudança estrita de lei e não com abrangência de garantir direitos,
como hoje observamos. Coisa séria! Setores da educação não se envolveram na
discussão da posição desta lei que é tida por todo mundo como uma lei
maravilhosa.
Vejo com atenção, humildade e espírito
critico que somos culpados pelo abandono de nossas crianças.
Diz o ECA, art. 3º “A criança e o
adolescente gozam de todos os direitos fundamentais inerentes à pessoa humana,
sem prejuízo da proteção integral de que trata essa lei".
Proteção integral do que trata essa lei
é a chave da questão que a gente ainda não se deu conta.
Art. 4º: “É dever da família, da
comunidade, da sociedade em geral e do poder público assegurar, com absoluta
prioridade, a efetivação dos direitos referentes à vida, à saúde, à
alimentação, à educação, ao esporte, ao lazer, à profissionalização, à cultura,
à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária
para criança”.
Nada disso parecer ser fundamentos do
ECA: "Direito à vida e à saúde, direito à liberdade, ao respeito e à
dignidade, direito à convivência familiar e comunitária, direito à cultura, ao
esporte e ao lazer, direito à profissionalização e à proteção no
trabalho”.
Qual desses fundamentos, que acabei de
elencar, qual ou quais desses está ou estão sendo observados integralmente?
Para concluir, Senhor Presidente, nós
ficamos mais tristes, quando deparamos com as seguintes notícias: jornal “O
Globo”, 12 de maio de 2015: “Apreensão de menores no Rio cresce mais do que a
prisão de adultos”. Vou repetir: “Apreensão de menores no Rio cresce mais do
que a prisão de adultos”.
Segunda: “Estado terá mais nove casas
de detenção para menores infratores.” Atentem para essas duas manchetes: uma é
do “O Globo” e a segunda é do “O Dia”. Serão mais 700 vagas para adolescentes.
A sociedade comemorou isto com farras, com churrascos, e eu diria: essas
manchetes deveriam envergonhar a sociedade, Senhor Presidente.
Pobre o país, pobre o país que, em
lugar de cuidar de suas crianças dando-lhes prioridade absoluta para prevenir
problemas sociais decorrentes do abandono, preocupa-se em trancafiar jovens,
atribuindo-lhes toda responsabilidade, e a sociedade, como um todo, teima em
não reconhecer seu papel de proteger a criança no sentido amplo.
Querem enfrentar a grande verdade? As
nossas crianças estão abandonadas dentro de casa, dentro da escola e até dentro
da igreja. Temos que ter a humildade para reconhecer isso e fazermea culpa,
antes de qualquer ação. A criança tem que ser alvo de nossa prioridade
absoluta.
Muito obrigado.