terça-feira, 26 de janeiro de 2016

1ª Parte do Grande Expediente 01/09/2015 Discurso 65ª Sessão


1ª Parte do Grande Expediente
01/09/2015

Discurso
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65ª Sessão

Senhor Presidente, senhores vereadores, senhoras e senhores, as autoridades brasileiras reiteradas vezes vêm tendo atitudes que afrontam o nosso ordenamento jurídico, especialmente desrespeitando a Constituição Brasileira e os acordos internacionais de que o Brasil é signatário.
Esse comportamento trás insegurança para todos nós. Hoje eles afetam os mais pobres, os mais humildes, os negros, as crianças e os idosos. E amanhã?
Na semana passada, aqui no Rio de Janeiro, os agentes públicos de segurança ignoraram um dos princípios fundamentais, o princípio da presunção de inocência que, no Brasil, é um dos princípios basilares do Direito, responsável por tutelar a liberdade dos indivíduos, sendo previsto no Artigo 5º, Inciso l57, da Constituição Brasileira, que enuncia:
“Ninguém será considerado culpado até trânsito em julgado de sentença penal condenatória.”
Tendo em vista que a Constituição Federal é a nossa lei suprema, toda legislação infraconstitucional deverá absorver e obedecer tal princípio.
É certo, é lógico, é legítimo que o Estado brasileiro tenha o direito e o interesse em punir indivíduos que tenham condutas em desconformidade com a lei, podendo aplicar sanção àqueles que cometem ilícitos. No entanto esse direito-dever de punir do Estado deve conviver e respeitar a liberdade pessoal, um bem jurídico do qual o cidadão não pode ser privado, senão dentro dos limites da lei.
Portanto, diante do cometimento de um ilícito, para que o Estado imponha pena, ele deverá respeitar o suposto autor de tal ilícito, dando-lhe todas as garantias constitucionais, e permitindo que este se defenda, e não tenha sua liberdade cerceada. Sendo necessário, portanto, que ocorra um processo, e enquanto não houver sentença transitada em julgado, em que o Estado prove a culpabilidade, o suposto autor será presumido inocente.
O Princípio da presunção da inocência veio a ganhar repercussão universal com a Declaração dos Direitos Humanos da ONU, em 1948, que afirmou em seu art. 11: "Toda pessoa acusada de delito tem direito a que se presuma sua inocência, enquanto não se prova sua culpabilidade, de acordo com a lei e em processo público no qual se assegurem todas as garantias necessárias para sua defesa".
O Brasil, ao votar na Assembleia-geral da ONU de 1948, colaborando para originar essa Declaração dos Direitos Humanos, estava ratificando tal Princípio.
No entanto, só 40 anos depois é que veio de fato ser positivado na legislação brasileira. Só com a Constituição Federal de 1988 é que o Brasil incorporou expressamente a Presunção de Inocência como princípio basilar do seu ordenamento jurídico. Isso não implica dizer que até então o país era totalmente estranho a ele, porque outros princípios, como os do contraditório e da ampla defesa, já davam esse norte para os processos e decisões da justiça brasileira.
Em 1992, o Brasil internalizou a Convenção Americana sobre Direitos Humanos, o Pacto de São José da Costa Rica, que estabeleceu em seu art. 8º, inciso I, o Princípio da Presunção de Inocência ao afirmar que: "Toda pessoa acusada de delito tem direito a que se presuma sua inocência enquanto não se comprove legalmente sua culpa".
Diante disso, ficamos perplexos, quando agentes públicos ignoram a Constituição e os tratados e convenções que são compromissos assumidos perante a comunidade internacional.
O mais curioso é que essa afronta não atinge os poderosos, os que são denunciados pelo Ministério Público na Operação Lava Jato, por exemplo. Os suspeitos de roubarem o dinheiro público, os que enriquecem ilicitamente, os que depositam dinheiro desviado dos cofres público brasileiros em paraísos fiscais e os que desfalcam a Petrobras recebem o tratamento levando em conta esse Princípio, o que é justo. Mas por que isso não é feito para os menos favorecidos?
Naquela semana, os jornais publicaram a manchete: "PM aborda ônibus e recolhe adolescentes a caminho das praias da Zona Sul do Rio". Cito, neste momento, trechos da reportagem do Jornal Extra sobre o tema:
(LENDO)
“1- Eram por volta das 14h30min de ontem (naquela data) quando 15 jovens, a maioria da periferia do Rio, se revezavam em um banco para quatro lugares no corredor externo do Centro Integrado de Atendimento à Criança e ao Adolescente (CIACA), em Laranjeiras, após terem sido recolhidos pela Polícia Militar. O motivo?... Estavam indo para as praias da Zona Sul do Rio". O motivo deles serem recolhidos? “Estavam indo para as praias da Zona Sul do Rio.” – palavras do Jornal Extra.
2- "Do grupo que havia sido retirado de um ônibus que chegava a Copacabana, só um rapaz era branco. Os outros 14 tinham o mesmo perfil: negros e pobres. Todos os jovens ouvidos pelo Extraestavam em linhas que saem da Zona Norte em direção à Orla. Nenhum deles portava drogas ou armas.”
(INTERROMPENDO A LEITURA)
Vou repetir palavras do Extra: “Nenhum deles portava drogas ou armas.”
(LENDO)
“3 – Pedindo anonimato, quatro funcionários da Secretaria Municipal de Desenvolvimento Social que estavam no local disseram não concordar com o recolhimento dos menores. Uma conselheira tutelar, que preferiu também não se identificar, não conteve a revolta com a situação que, segundo ela, tornou-se corriqueira. ‘No início, o critério era estar sem documento e dinheiro para a passagem. Agora, está sem critério nenhum. É pobre? Vem para cá! Só pegam quem está indo para as praias da Zona Sul. Só hoje (domingo) foram cerca de 70. Ontem (sábado), foram 90. A polícia está privando de liberdade esses adolescentes que não cometeram qualquer ato infracional. Isso é inaceitável – dizia a conselheira tutelar –, algo que se fazia na ditadura militar”.
Palavras da conselheira tutelar transcritas pelo jornal Extra.
É evidente que os agentes de segurança pública têm que trabalhar com a prevenção. Isso ninguém discute. Os agentes de segurança pública têm que trabalhar - e eu acho que até prioritariamente - com a prevenção. Não se discute e se louva até. Também reconhecemos que têm ocorrido muitos problemas nos ônibus envolvendo jovens, especialmente nos finais de semana. Também é verdade. As praias têm sido palco de arrastões e de outros casos intoleráveis. Também é verdade incontestável há muito tempo! Mas não se pode prender por prevenção quem nada cometeu.
Vou repetir: Não se pode prender por prevenção quem nada cometeu. Isso é ilícito! É inconstitucional! É absurdo! É ferir a Constituição, as Leis Infraconstitucionais e todos os acordos que o Brasil tem assinado com outras Nações civilizadas.
Se aprovarmos o desrespeito aos princípios constitucionais de alguns, amanhã estaremos com os nossos direitos agredidos. Isso é significativo! As pessoas não olham para o seu próprio interior. Aprovar subtrair direitos dos outros corresponde, amanhã, ter que admitir subtrair os seus próprios direitos.
Vou encerrar, Senhor Presidente. Os mesmos documentos jurídicos que citamos acima são os que protegem a liberdade de expressão de que a Imprensa tanto precisa. Imaginem se amanhã quiserem cercear a liberdade da Imprensa? A liberdade de culto; a inviolabilidade de nosso domicílio; o direito de herança; a proteção à propriedade; o direito de resposta; a livre expressão artística, intelectual, científica e de comunicação; a nossa honra e a nossa intimidade; o sigilo de correspondência e das comunicações telefônicas entre outros direitos fundamentais.
Queremos segurança pública, mas acima de tudo, queremos que as medidas a serem tomadas para nos proteger estejam dentro da constitucionalidade e da legalidade.

Muito obrigado, Senhor Presidente.