terça-feira, 26 de janeiro de 2016

1ª Parte do Grande Expediente 01/12/2015 Discurso 104ª Sessão

1ª Parte do Grande Expediente
01/12/2015

Discurso
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104ª Sessão

Senhor Presidente, Vereador Dr. Eduardo Moura, senhores vereadores Reimont, Jimmy Pereira, Leonel Brizola Neto, senhoras e senhores:
Quando a gente pensa que já viu tudo na vida, nos nossos 68 anos de idade, de repente a gente vê no Jornal Extra uma reportagem e outros jornais também publicam, no dia 30/11/15, outdoor pedindo fim de privilégios para os deficientes.
“Na manhã desta segunda-feira, o bairro de Vista Alegre, em Curitiba (PR), acordou assustado com um outdoor pedindo, em letras garrafais, o fim dos privilégios para deficientes. A placa, sem muitos detalhes, foi instalada na Rua Santa Cecília e conta também com o nome do grupo responsável pela reivindicação. Uma foto foi tirada por um diretor de redação da Rádio Banda B, uma das principais da cidade. “Quando passei e vi, me deu um embrulho no estômago. Depois fui procurar no Facebook e fiquei mais indignada ainda. Como pode?", declarou Laura Pimentel, mãe de uma criança deficiente, em uma mensagem enviada ao Programa Luiz Carlos Martins, carro-chefe da rádio. Criada há menos de 24 horas, a página no Facebook "Movimento Pela Reforma de Direitos" conta com uma petição pública em aberto. Mas, na rede social, o grupo já fez postagens em que exibe algumas de suas bandeiras, como a redução em 50% das vagas para deficientes, o fim das cotas para deficientes em empresas, o fim da isenção de impostos para deficientes no ato de compra de um carro zero km, fim das cotas para deficientes em concursos públicos e fim da gratuidade para a entrada de deficientes em eventos culturais”.
É inacreditável que isso tenha acontecido. Você há de dizer: “mas é em Curitiba”, só que com os meios de comunicação, com a Internet, isso se espalha de Curitiba ao Rio de Janeiro, São Paulo, Pequim, Roma etc. Eu não vou ler porque seria uma afronta a mim mesmo e à dignidade da pessoa as argumentações que essas figuras deploráveis colocam como justificativa. São vários absurdos e eu preferi trazer um texto para a reflexão.
“A deficiência no ser humano, em qualquer de suas modalidades, evidentemente não é tema novo. No entanto, a preocupação com a sua prevenção e a proteção das pessoas com deficiência são temas recentes. Um importante divisor de águas para o estudo da proteção das pessoas com deficiências foi a ocorrência das duas grandes guerras mundiais, o que fez aumentar, desgraçadamente, o número de pessoas com deficiência de locomoção, de audição e de visão. Esse agravamento do número de pessoas com deficiências fez com que esse drama ficasse exposto de forma mais incisiva, exigindo do Estado uma posição de agente protetor. Cada ordenamento jurídico trata o tema com características especiais. Há países em que a proteção é mais efetiva, apesar de inexistir qualquer comando, em nível constitucional, para garantir essa proteção. De outro lado, podemos encontrar países - e infelizmente nos encontramos nesse rol - em que, apesar da garantia constitucional, o tema é tratado de forma insuficiente pelo legislador infraconstitucional e pelas autoridades em geral.
Por certo que, no Brasil, as guerras mundiais não acarretaram a conscientização do problema da deficiência, tal como ocorreu no velho continente. Entre nós, o número elevado de pessoas com deficiência não tem a mesma causa dos países da Europa e dos Estados Unidos. Nosso índice assustador se deve aos acidentes de trânsito, à carência alimentar e à falta de condições de higiene. Essa taxa da deficiência no Brasil, que atinge 10% da população, fator reconhecido pela Organização das Nações Unidas, só recentemente resultou em preocupação constitucional. Assim, com exceção da regra isonômica, a proteção das pessoas com deficiência nunca foi tema constante dos textos constitucionais brasileiros.
A Emenda Constitucional nº 1, de 1969, trouxe a primeira notícia de proteção específica à pessoa com deficiência. A Emenda nº 12, de 1978, ampliou esses direitos, estando os mesmos presentes na Carta Política de 1988. O problema das pessoas com deficiência, todavia, não se restringe apenas a uma proteção, visando à inclusão social. Deve-se ter em conta a prevenção da deficiência, o que leva o estudioso para as áreas de alimentação, saúde pública e outros campos das políticas públicas.
Os índices fornecidos pela Organização das Nações Unidas são, no mínimo, alarmantes e a taxa é elevadíssima. A questão não se limita, porém, ao problema da proteção do Estado. O relacionamento do portador de deficiência se inicia, muitas vezes, com o total despreparo dos pais para receberem um filho portador de deficiência. Qual o pai ou a mãe que pensaria que seu filho poderia nascer portador de deficiência? O casal está preparado — e isso é compreensível — para receber um bebê sem qualquer problema. Todos os projetos e expectativas têm, como alvo, uma criança sem nenhuma deficiência. Assim, no caso de deficiência congênita ou adquirida durante o nascimento, a criança começa a enfrentar seus primeiros problemas, oriundos da rejeição, em razão do despreparo de seus pais. O relacionamento com estes últimos não chega a ser o único obstáculo vivido pelas pessoas com deficiência. A convivência social é outra barreira bastante grande. Quantos indivíduos, por exemplo, estão preparados para manter relacionamento com urna criança com Síndrome de Down? Quantas pessoas se sentem tranquilas para manter uma conversação, sem constrangimentos, com uma pessoa paraplégica? Por mais que nos sintamos amadurecidos para enfrentar essa situação, a pessoa com deficiência notará certa ansiedade e algum desconforto nesse relacionamento, no mínimo, por falta de naturalidade. Isto se deve à circunstância de que a inclusão dos indivíduos deficientes não é exercitada pela sociedade como um todo.
O fato macabro de Curitiba é muito triste. Portanto, é muito triste constatamos que ainda existem pessoas que não têm sensibilidade para questões tão humanas quanto as que dizem respeito às pessoas portadoras de deficiência. Esse episódio de Curitiba não pode ser repetido”.
Muito obrigado, Senhor Presidente.