domingo, 15 de julho de 2012

Com batalhão de Choque , ocorre , de madrugada , na calada da noite , transferência de pacientes do IASERJ.


Transferência coloca em risco os pacientes do Iaserj, dizem servidores .Removeram pacientes especiais de forma truculenta, segundo a técnica responsável
A transferência – na calada da noite, de forma pouco usual e até truculenta - de pacientes do Hospital Central do Instituto de Assistência aos Servidores do Estado do Rio de Janeiro (Iaserj) na Avenida Henrique Valadares, no Centro do Rio, para outras instituições de saúde, não significa para os funcionários apenas o risco de perda dos empregos e quebra do vínculo com o ambiente de trabalho, mas ameaça aos próprios pacientes.

O Hospital será desativado para que seu prédio possa servir à ampliação do Instituto do Câncer. As remoções, tão logo liberadas pela Justiça, começaram a ser feitas na noite de sábado debaixo de escolta do Batalhão de Choque, como se houvessem marginais. Segundo médicos, estas transferências provocarão desperdícios. Serão perdidos, por exemplo, 16 leitos do Centro de Tratamento Intensivo (CTI) criados há apenas quatro anos. Isto em um estado onde 15º pacientes estão necessitados desta espécie de tratamento e aguardam uma vaga na fila.


Tratamentos ameaçados

Ali viviam, há 8 anos, Rosa Barcelos Rosa, de 56 anos, portadora de Síndrome de Down, e Andreia Paixão, de 38, que sofre de paralisia cerebral. De pacientes abandonadas, sem vínculos sociais, transformaram-se em mascotes daquela comunidade. A remoção delas para o Hospital Eduardo Rabello, no longínquo bairro de Campo Grande, na zona Oeste, comoveu e revoltou todos, de porteiro ao pessoal da CTI.
Antônia Maria dos Santos, técnica de enfermagem que os funcionários consideram a mãe das duas internas, não conteve as lágrimas e as críticas ao comentar a remoção de suas ‘filhas’. Sem ter assistido a transferência das ocupantes dos leitos 9 e 10 da enfermaria 53, ‘Tuninha’, como a enfermeira é chamada pelas pacientes, misturou indignação, tristeza, saudade, e medo ao falar das ‘meninas’:
“Sou casada, mas nunca tive filhos. Encontrei nelas o amor filial e sabia que elas gostavam de mim como a uma mãe. Ao longo dos anos em que viveram aqui, nós demos roupas, móveis, tudo. É inadmissível saber que foram arrancadas daqui no meio da madrugada, carregadas em lençol. É muita truculência e desrespeito ao paciente. Nem uma maca foram capazes de lhes fornecer”, protestou. “Fico imaginando o rostinho delas quando chegarem ao novo hospital, com pessoas diferentes, outro ambiente. Ficarão amedrontadas, perdidas”.
A enfermeira Márcia Silveira, no Iaserj desde 1990, lembrou da entrada delas, em 1994. Triste, ela teme uma ‘provável regressão’ nos avanços cognitivos e motores apresentados pelas duas ao longo da internação no Iaserj.

“Elas chegaram aqui se alimentando na mamadeira, pouco falavam. São pessoas que carregam traumas antigos, de abandono familiar, agressão. Encontraram aqui abrigo, amor, que as fez melhorar. Já se alimentavam sozinhas, faziam festas, retribuíam ao carinho recebido. Tenho medo que elas possam piorar, e até mesmo morrer”.
Pacientes em risco

Chefe do Centro de Tratamentos de Feridas (Cetafe), única unidade na especialidade no estado, a dermatologista Cristina Maria Machado Maia criticou a falta de planejamento ao se iniciar, ‘de forma repentina e despreparada’, o fechamento do Iaserj. Segundo ela, que tem sob sua responsabilidade 600 prontuários, os pacientes não foram comunicados.

“Temos aqui 105 salas de ambulatório. O prédio no Maracanã, para onde será transferido o Cetefe, tem somente 30”, explicou. “Alguns pacientes precisam trocar os curativos das feridas a cada 7 dias. O prazo de alguns deles termina nesta semana que entra. Ninguém sabe se o Iaserj abre amanhã (segunda-feira, 16) ou quando abre. A situação é gravíssima. Pode haver, inclusive, amputações”.

Para membros da equipe de intensivistas (que atendem no tratamento intensivo) do Iaserj, que foi toda transferida para o Hospital Getúlio Vargas (HGV), na Penha (Zona Norte) junto com os pacientes, a remoção é assustadora. Seus médicos lamentam o fechamento da CTI, criada em 2008 e com ‘muita lenha pra queimar’.
“Recentemente, foram inauguradas 24 UTIs no HGV. Com a transferência do setor daqui para a Penha, o ganho real na rede estadual de saúde será de apenas oito leitos. Esta situação, em um Estado que tem 150 pessoas aguardando uma vaga em CTI, é lamentável. Eles não estão nem aí se 10% destes pacientes morrerem esperando vaga”.

A intervenção na CTI do Iaserj, segundo o médico ouvido pelo JB, e que preferiu o anonimato, põe em risco os transferidos.

“Infelizmente, o Estado não observa a vida humana. Ninguém da equipe de intensivistas do Iaserj assinou qualquer termo de liberação ou atestou a condição clínica dos pacientes removidos. A responsabilidade é, integralmente, da secretaria estadual de Saúde”, disse o intensivista. “Apenas um paciente ficou aqui, por não ter condição alguma de ser transferido. É muito pouco provável que ele se recupere, ficaremos aqui enquanto ele resistir”.
Funcionária do Hospital, onde é secretária da direção da unidade há 8 anos, Andrea Assunção, criticou a administração do Iaserj. Para ela, além do risco dos funcionários perderem o emprego, a população do entorno do local ficará desassistida.

“O Iaserj não existe para o governo estadual. Que hospital a população do Centro vai utilizar? O Souza Aguiar já está completamente lotado, com filas gigantes. As pessoas entravam aqui e saíam vivas, saudáveis. Acabaram com um hospital excelente”, disse. “A administração do Pedro Cirilo pode ser considerada horrorosa, ele fez de tudo para fechar isso daqui. Os funcionários que não são concursados sairão com uma mão na frente e outra atrás”.