terça-feira, 5 de janeiro de 2016

1ª Parte do Grande Expediente 14/05/2015 Discurso 34ª Sessão

1ª Parte do Grande Expediente
14/05/2015

Discurso
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34ª Sessão

Senhor Presidente, Senhores Vereadores Paulo Pinheiro, Renato Cinco, Edson Zanata, Eduardo Moura, senhoras e senhores, mais uma vez venho a esta tribuna preocupado: querem nos dar um golpe, um golpe na Constituição, rasgar a Constituição e colocar em risco todos os direitos adquiridos na promulgação da Constituição de 88 – isso é muito sério.
O título da minha fala é: A Inconstitucionalidade da Redução da Maior Idade Penal.
A Constituição da República Federativa do Brasil foi promulgada em 5 de outubro de 1988 pelo presidente da Assembleia Nacional Constituinte, o Deputado Ulysses Guimarães, e se caracteriza por ter regras e princípios com força normativa.
Os parlamentares que a redigiram foram eleitos em novembro de 1986 e iniciaram seus trabalhos em 1º de fevereiro de 1987. Aqueles parlamentares formaram o Poder Constituinte Originário, cuja função foi elaborar a Carta Magna. Os parlamentares de hoje constituem o Poder Derivado.
O Poder Originário, quando se instala, é ilimitado; o Derivado tem limitações, pois não pode abolir as cláusulas pétreas.
Para esclarecer: quando se instala uma Constituinte, uma Assembleia, ela rasga a Constituição anterior. Se quiser aproveitar alguma coisa, aproveita, mas ela tem um poder ilimitado – esse é o Poder Originário. O que temos, hoje, não é uma Constituinte. Temos lá parlamentares que constituem o que nós chamamos de Poder Derivado – eles não podem rasgar a Constituição totalmente. Podem até emendar com quórum qualificado, mas não podem mexer em cláusulas pétreas.
Na Constituição Brasileira existem dispositivos que não podem sofrer alteração nem ser abolidos, até mesmo por emenda. Esses dispositivos são as cláusulas pétreas, que são limitadoras do poder de reforma da Constituição de qualquer Estado. Quais são as cláusulas pétreas da nossa Constituição vigente? (1) A forma federativa do Estado — não se discute. (2) O voto direto, secreto, universal e periódico — não se pode mexer nisso. Também não se pode mexer na separação dos Poderes: Legislativo, Executivo e Judiciário. E no Inciso IV está lá: os direitos e garantias individuais — não se pode mexer nisso. Onde estão esses direitos e garantias individuais? A princípio, eles estão primeiramente elencados no Art. 5º da Constituição, que estabelece esse rol de direitos e garantias, sendo desnecessário discutir se são ou não amparados pelo parágrafo 4º do Art. 60 da Constituição. O parágrafo 4º do Art. 60 é esse parágrafo que define as cláusulas pétreas que acabei de citar, entre elas, os direitos e garantias individuais. Portanto, não se pode mexer. O Art. 5º já define quais são esses direitos. Não se pode mexer naquilo. Mas, aí, essa gente que está querendo mexer nos direitos, está querendo confundir tudo. Os direitos e garantias individuais não estão apenas, exclusivamente, no Art. 5º; estão por toda a Constituição.
No parágrafo 2º do Art. 5º, diz o seguinte: “São direitos e garantias individuais as normas dispersas pelo texto constitucional”. Então, há vários artigos pelo texto constitucional que são direitos e garantias individuais, e não apenas os elencados no Art. 5º.
Olha o que diz o Art. 5º, no parágrafo 2º, que fala isso: “Os direitos e garantias expressos nesta Constituição não excluem outros decorrentes do regime democrático, dos princípios por ela adotados” — princípios, guardem isso — “ou dos tratados internacionais em que a República Federativa do Brasil seja parte”. Se, amanhã, a República Federativa do Brasil assinar um contrato e surgir um novo direito, faz parte das cláusulas pétreas.
Esse parágrafo nos traz duas certezas. Primeiro, a Constituição admite que encerra em seu corpo direitos e garantias individuais e que o rol do Art. 5º não é exaustivo — portanto, por toda a Constituição, nós temos direitos e garantias que não podem ser mexidos. Segundo, direitos e garantias concernentes com os princípios da própria Constituição e de tratados firmados pelo Brasil integram o referido rol, mesmo fora da lista.
Com a Constituição de 88, a questão da inimputabilidade penal passou a ser questão constitucional; antes não era. Da mesma forma com que tratou várias questões penais lá no Art. 5º, quando tratou dos direitos e garantias individuais. Aí vem a grande questão que eles querem mexer: o Art. 228. O Art. 228 diz assim: “São penalmente inimputáveis os menores de 18 anos sujeitos às normas da legislação específica”.
Alguns alegam que este dispositivo não é direito fundamental, quer dizer, não é cláusula pétrea, porque não está no Art. 5º. Mas eu já mostrei que não. A própria Constituição, no seu parágrafo 2º do Art. 5º, diz isso. Esse artigo se encontra no Capítulo VII, que trata da Família, da Criança, do Adolescente, do Jovem e do Idoso. Por sua vez, esse capítulo faz parte do Título VIII, ou seja, tema da Ordem Social. Nesse Capítulo VII se encontra o princípio. Princípio é garantia. É cláusula pétrea. Então, nesse capítulo, se encontra o princípio da prioridade absoluta, que é também uma garantia constitucional e, portanto, uma cláusula pétrea. Portanto, não podem mexer no Art. 228.
É indiscutível que todo e qualquer direito e garantia individual previsto no corpo da Constituição brasileira de 88 é insuscetível de emenda tendente a aboli-los. Em relação a esse tema assim se posiciona Ives Grandra Martins. Olha o que ele diz: Os direitos e garantias individuais conformam uma norma pétrea, não são eles apenas que estão no artigo 5º, mas como determina o parágrafo 2º do mesmo artigo inclui outro que se espalha pelo texto constitucional e outros que decorrem da implicitude inequívoca. Trata-se, portanto, de um elenco cuja extensão não se encontra em textos constitucionais anteriores. Mas que estão a partir de 1988. No que se refere a inimputabilidade penal diz ele: deixou ao constituinte o capítulo que trata da criança e do adolescente por questão de técnica legislativa. Ao invés de botar no 5º, botou lá no capítulo que trata da família, do idoso, da criança. E por que isso? Porque duas emendas populares apresentadas pelos grupos de defesa de crianças e adolescentes fizeram inserir na Constituição os princípios da doutrina da proteção integral. Princípio cláusula pétrea. Consubstanciado nas normas das Nações Unidas.
Portanto, o Brasil é signatário disso. Dessa forma, nada mais lógico do que inserir os direitos da criança e do adolescente no capítulo da família; por isso que foi para o artigo 228 e não no 5º, e é por isso que eles querem derrubar, reduzir a maioridade. Não está no 5º, está lá no 228 e não é cláusula pétrea. A intenção foi separar os direitos e garantias das crianças e dos adolescentes das disposições relativas ao conjunto da cidadania.
Quer dizer, da proteção especial à criança e ao adolescente. Técnica perfeita. Assim, elegeu tais direitos, colocando-os em artigo próprio, com um princípio intitulado de prioridade absoluta, que faz com que a criança tenha prioridade na implementação de políticas públicas, por exemplo, e, desta forma, inclusive por questão de coerência jurídico-constitucional, não iria deixar ao desabrigo do artigo 60, parágrafo 42, inciso IV, os direitos e garantias individuais das crianças e dos adolescentes, quando foi justamente o contrário que desejou fazer e o fez.
Então para concluir, ferir ou abolir a cláusula pétrea é golpe. Pois significa rasgar a Constituição, todos os nossos direitos estarão em risco se isso ocorrer. Portanto, é um tema sério e as pessoas que estão liderando esse movimento estão pegando cidadãos nos momentos de paixão e emoção. É claro que quando a gente vê uma pessoa sendo agredida por um menor, a gente acaba se envolvendo nesse debate e até imaginando que seja correta a redução da maioridade penal. Mas não é por aí. Porque na hora que a gente rasga o direito e a cláusula pétrea você rasga toda a Constituição e todos os direitos adquiridos de todas as pessoas, maiores ou não, idosos ou não, todos estaremos com os nossos direitos colocados em xeque.

Muito obrigado.